terça-feira, 7 de junho de 2011

Sessão da Classe apresenta MEMÓRIA DO EFÊMERO e o DOCUMENTO EM VÍDEO, por Newton Silva

Teatro em Porto Alegre nos Anos 1980:
Uma história narrada a partir de documentos em vídeo veiculados na TVE/RS

Blackout. As luzes se apagam lentamente. A cena, no palco, desaparece: último ato da peça que termina a temporada para sempre. Na plateia, espectadores gravam na retina o momento que nunca mais se repetirá. Lembrança, memória, registro do irrecuperável. Uma imagem que ficou, ou se foi, no turbilhão de fragmentos do cotidiano.

O Ferreiro e a morte, direção de Camilo de Lélis - foto Cláudio Saldanha















A apresentação teatral, por seu caráter efêmero, constrói uma relação especial com o tempo que é diferente de outras linguagens artísticas, como a literatura, cinema ou artes visuais. Nelas, a existência de um documento (livro, filme, pintura, escultura, etc.) garante ao receptor a possibilidade de ler-reler ou ver-rever o objeto estético. Ainda que o espectador retorne à mesma obra em vários momentos de sua vida e que, modificado como sujeito, tenha outras interpretações e sensações no momento da nova fruição, aquele objeto artístico permanece igual. O que muda são as circunstâncias do ato receptivo. A obra foi realizada no passado pelo artista mas é recebida no presente pelo espectador, fato que configura uma tensão entre o “passado da obra” e o “presente da recepção”.

Nas artes cênicas ou em ações artísticas performáticas, a relação entre obra e espectador acontece de outra maneira. Durante a realização do espetáculo (no momento do acontecimento real – a encenação) reina o tempo presente, o aqui agora. É uma sucessão de imagens, sons e textos enunciados, sem possibilidade de retorno. O tempo da representação teatral e da recepção ocorre, obrigatoriamente, de forma sincrônica por meio de ações feitas e recebidas no presente. O mesmo espectador, caso volte ao teatro em outro dia, para ver a mesma obra, não assistirá ao mesmo espetáculo. Os signos cênicos poderão se repetir em cena mas com variações de intensidade na execução no trabalho do ator, no uso do espaço cênico ou na iluminação. A principal diferença em relação às demais linguagens artísticas está no fato de que a obra nunca será a mesma. Aqui, o processo comunicativo apresenta o embate simultâneo entre o “presente da obra” e o “presente da recepção”. Ao final de cada espetáculo, a obra desaparece para sempre. Restam apenas rastros de seu acontecimento na memória dos espectadores.

Diante destas características do fato teatral, como guardar para a posteridade a cena que não voltará mais? Como concretizar uma cultura imaterial, como as artes cênicas, em documentos e imagens para a história? De que maneira a gravação do espetáculo em vídeo, um dos recursos tecnológicos da contemporaneidade, contribui neste registro da memória?

programa da peça A mãe da miss e o pai do punk
direção de Luiz Arthur Nunes

São perguntas que surgiram a partir da pesquisa de mestrado Palcos da Vida: o vídeo como documento do teatro, desenvolvida no Programa de Pós-Graduação em Artes Cênicas da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (PPGAC/UFRGS) e defendida em 14 de julho de 2010. O trabalho investiga os processos de produção e de experimentação teatral, em Porto Alegre, nos anos 1980, a partir de registros em vídeo feitos pela TVE/RS. Nos últimos três anos daquela década, a emissora pública de televisão gravou diversos espetáculos teatrais que estavam em cartaz na cidade. Os programas, com o título Palcos da Vida, apresentavam cenas das peças e depoimentos de atores e diretores. A pesquisa lança um olhar sobre aquele momento histórico e, por meio das gravações, ressalta a importância do vídeo como documento do teatro.

Que testemunhos o texto televisivo (entendido como a fusão de imagem, som, linguagem verbal e práticas de montagem) pode fornecer sobre a encenação teatral (o texto espetacular), como evidência dos acontecimentos cênicos? Que aspectos estão envolvidos no encontro entre teatro e televisão? Seria possível reconstituir um painel das artes cênicas, ainda que fragmentado, tendo como base os vídeos realizados e exibidos no Canal 7? E quais são as contribuições e os limites destes documentários como registro do fazer teatral?

Frame da gravação de OSTAL para o programa Palcos da Vida
Montagem do Ói Nóis Aqui Traveiz














A pesquisa enfoca os espetáculos A Mãe da Miss e o Pai do Punk (direção de Luiz Arthur Nunes), A Verdadeira História de Édipo Rei (Grupo Gregos & Troianos), Escondida na Calcinha (direção de Patsy Cecato), Império da Cobiça (Grupo TEAR), O Ferreiro e a Morte (Grupo Teatral Face & Carretos), Ostal (Tribo de Atuadores Ói Nóis Aqui Traveiz) e Tangos e Tragédias (de Hique Gomez e Nico Nicolaiewsky). O conjunto traça um painel das artes cênicas do Rio Grande do Sul, constituindo-se em um importante acervo sobre a produção e a encenação teatrais.

Se você quiser acessar a dissertação do Newton Silva, é só clicar AQUI.

E para a programação completa do
Sessão da Classe | MEMÓRIA DO EFÊMERO

É só clicar AQUI para acessar a postagem com toda a programação do dia 16 de junho.

3 comentários:

  1. É isso aí Newton! Parabéns! Abraços, Ochôa

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  2. Que rico material este, dos espetáculos gravados pela TVE. Newton, estes vídeos estão disponíveis para serem vistos por todos? Onde? Abraço e parabéns pelo trabalho!

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  3. Pessoal: Os vídeos podem ser acessados. Eles estão anexados à minha dissertação de mestrado. Há cópias nas bibliotecas do Instituto de Artes da UFRGS. E também no Museu de Comunicação Social e Museu Joaquim Felizardo. Um abraço a todos. Valeu Ochôa e Marcelo pelo carinho.
    Newton Silva

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